Se tem uma coisa que eu assumo
que gosto em mim, sem a menor falsa modéstia, é meu senso de humor. Acho graça
de muita coisa e até hoje não consigo me lembrar de alguma situação de minha
vida que tenha me deixado sem conseguir fazer pelo menos uma piadinha. E não
estou falando daquele humor fora de hora, mal colocado, que só Freud explica,
não. É que eu sou meio esquisitinha e sinceramente consigo perceber a ironia
das coisas, principalmente quando sou eu quem é a vítima da situação.
E eu sei exatamente de onde vem meu senso de
humor. De minha mãe, herdei o sarcasmo, a ironia e a tendência a gostar de
situações do tipo "perco o amigo, mas não perco a piada".
Recentemente, por exemplo, fomos a uma festa na casa de uma tia que é torcedora
fanática do Bahia. Pra vocês terem uma idéia ela tem 73 anos e vai pro estádio
sozinha ver o Bahia jogar, se ninguém quiser ir com ela. Como ela é sócia do
Bahia de carteirinha, ela não perde um só jogo dentro de casa. No dia dessa
festinha, o irmão de minha mãe, estava arrumado, só esperendo a gente pra sair,
quando ela chega pra ele e o aconselha a trocar de camisa. Prontamente minha
mãe diz "veste essa aqui" e o entrega uma camisa que, na opinião dela
era mais bonita. Detalhe: a camisa que ela deu pra ele vestir era do Vitória. O
coitado do meu tio, escapou de ser linchado por pouco e gastou muita saliva pra
explicar que não dava a mínima pra futebol e que tinha sido vítima de uma
emboscada. Ao ser indagada, porque tinha usado o irmão como laranja, minha
mainha, com a cara mais lavada do universo, disse "eu sou Vitória mesmo.
Hoje a camisa não ia combinar com meu visual, mas eu precisava muito criar polêmica."
Mas nem sempre meu humor é assim afiado e
pre-meditado como o de minha mãe. Muitas vezes ele é bem bobão como o de meu
pai. Estava aqui fazendo uma espécie de flashback de momentos marcantes que
tive com ele e grande maioria tinha alguma besteira que foi bem engraçada.
Mesmo quando ele estava na pior. Me lembro que quando estava no hospital, uma
dia uma enfermeira chegou e ao encontrá-lo com cara de dor, foi logo
perguntando "Ô Sr. Valter, que cara é essa? Tá sentindo alguma dor?"
ao que ele respondeu: "Eu não, minha filha. E você?". Meu pai era um
cara leve, que sabia rir de absolutamente tudo. Com ele, se mesmo as piores
situações viravam piada, as melhores delas viravam risadas histéricas. Pra ele
pouco importava se o motivo da graça eram os outros ou ele mesmo, o importante
era ser engraçado e engraçadinho.
E como eu ria com ele! Meu pai
era besta, besta, besta. Assim como eu sei que eu sou. A gente ria de umas
coisas tão banais que perdi a conta das vezes que recebemos olhadas estranhas
de outras pessoas quando estavamos juntos por aí. Mas no geral a gente era
recebido muito bem. Sim, porque a maioria das pessoas adora rir e meu pai
sabia, como ninguém colocar um sorriso no rosto das que cruzavam seu caminho.
Eu adorava chegar com ele nos lugares e perceber como, seu senso de humor não
reconhecia hierarquia: sorrisos de chefões e peões se abriam diante da sua
presença. E cada "Oi seu Valter!" que recebia, era retribuído com os
seus habituais "olá, garotinho (a)!"
Perdi a conta das vezes que
eu, já com lágrimas nos olhos de tanto rir, implorava "Pára, meu pai! Tá
todo mundo olhando pra você, viu?" Ao que ele sempre respondia "Pra
mim mesmo, não. Eles estão olhando é pra sua cara de bunda." Mas eu nunca
quis realmente, que ele parasse de me fazer passar vergonha em público, quando
arrancava de mim gargalhadas descontroladas em lugares totalmente
inapropriados, como filas de banco ou bancos de igreja.
Mas hoje faz um mês que
eu ri com ele pela última vez. Desde então meu senso de humor anda como que
pela metade, faltando uma boa dose de leveza e besteirol. Nas minhas fotos mais
recentes, estou sempre com uma cara estranha, que a princípio confundi com a
tão falada cara de bunda, mas que logo, logo percebi que não se tratava disso e
sim de algo estranho vindo de meu olhar, que há um mês está cansado, sem brilho
e bem sem graça.
Saudade de rir de você e com
você, meu pai...